Arnaldinho
O sol era de arrebentar mamonas, aquele calor era mesmo indecente. Quem não estava na sombra, não tinha dúvidas, tinha a sensação de estar no quintal do inferno. Quem estava na sombra, estava perplexo com os que se exponham ao calor daquela luz da casa do capeta.
Debaixo de uma marquise longa que tinha árvores próximas, havia uma banda de pagode, rasgando ao som de cavaquinhos, cuíca reco reco e outros instrumentos. Um montão de gente, bebendo, dançando, outros curtindo a música, muitos observando e sendo observados.
Fulana! Aqui sozinha! Olavo esquecera o nome da mulher do amigo. Amigos de longa data, da época de juventude. Se bem que não se encontravam com o casal há três longos anos.
-- Não acredito! Você é quem estou pensando né? Perguntou Olavo.
-- Claro que sou essa pessoa sim Uhai! Faz mais de dois anos que não nos encontramos. Você continua o mesmo hein Olavo!
A indivídua, esposa do camarada, continuava como dantes, apesar de haver uma cerca eletrificada entre a gente e a esposa dos amigos, a dita cuja continuava doce de pimenta, garbosa.
-- Então! Me diga, cadê o Arnaldo? Estou com saudades daquele rapaz sumido, e de você também né!
A esposa de Arnaldo, espreitou o olhar para os pés de Olavo, depois fixou o olhar até os joelhos dele, retrocedeu três passos e avançou dois. Olhou e fulminou os olhos de Olavo com um olhar estático, tipo olho de vidro e falou:
-- Morreu! Graças a Deus, aquele seu amigo virou defunto, padeceu! Respondeu com a voz alterada para muito alto.
Por um momento, Olavo teve uma leve sensação que ele e ela eram as estrelas, o motivo de todos estarem ali, um calafrio percorreu como uma corrente elétrica da nuca até o calcanhar e voltou para a nuca toda arrepiada.
A sujeita começou a berrar como uma mulher histérica descontrolada, com os olhos fixos nos olhos de Olavo, rosnava e babava, uma baba viscosa e elástica como de um cão raivoso.
-- Seu amiguinho, Olavo, era um pulha, um brocha, um desgraçado. Uma semana depois que brochou, morreu, mal súbito, sei lá, infarto fulminante.
Que palhaçada é essa! Logo você! V em me perguntar de um sujeito que já virou presunto? Logo agora Olavo! Melhor amigo daquele pamonha! Vem me perguntar daquele cínico?
Ficar exposto ao sol daquela tarde, era fichinha para Olavo. Mas a vermelhidão do rosto era a soma de estar exposto ao sol mais a humilhação daquele momento.
-- Olha! com os olhos na unha encravada do pé direito da louca, mil desculpas, eu não encontro com ele há mais de três anos, eu não tive notícias de vocês, me perdoe. Mas afinal de contas, o que aconteceu?
Apesar da massa não se incomodar com o barraco que a tipinha armou, ela respirou fundo, pegou um copo de caipivodika, bebeu tudo, estava quente a bebida, bebeu tudo num gole só. Rosnou algo e cuspiu no chão.
-- Olavo, o falecido do seu amigo está enterrado. Ok! Tchau, preciso encontrar Ticiana na piscina. Dê lembranças à Paulinha.
Porra! O que aconteceu! Morreu! Virou presunto! Matutava Olavo, durante dias e dias. Olavo só pensava no amigo.
Felicidade ou fatalidade, seja lá o nome que dê, mas Olavo, fazendo a feira de sábado, encontrou com Arnaldo. Ao se verem, a alegria e o espasmo de felicidade foram intensos, absurdamente.
Arnaldo levou as mãos aos céus e gritou:
-- Meu Deus do céu! Eu não acredito! É você! Seu danadinho! Três longos anos hein rapaz?
Os amigos se abraçaram, olhavam um para o outro, riram à beça, falando sem parar ao mesmo tempo: Não é possível, você aqui, que coisa mais boa, rapaz! Que saudades de você! Por onde andava? O que tem feito da vida?
-- Arnaldo! Estou feliz em ver que você está vivo e bem, mas me diz uma coisa: Eu encontrei com a Valdete, Olavo lembrou o nome da fulana, ela me disse que você havia morrido! Afinal de contas, desembucha vai, o que aconteceu entre vocês?
-- Olavo! Vou ser detalhista porque você é sistemático, é meu melhor amigo. Lembra daquele colega nosso, o Gustavinho?
-- Sei, casado com a Marinalva, aquele casal avançadinho.
-- Pois é, continuou Arnaldo, nós fomos numa festa, nós quatro, bebendo, bebendo, conversando, de tudo um pouco sabe! Lá pelas duas da madruga, estávamos falando sobre masculinidade, que um selinho entre homens não tem nada a ver. Lembra do caso do atacante do Corinthians, o Emerson Sheik, ele deu um selinho num colega numa festa, lembra?
-- Pois é, eu já estava chapadão, e escorreguei na casca de banana e dei um selinho no Gustavinho.
--Meu Deus do céu, Putakipariu! Você não fez essa merda! Fala sério! sussurou para Arnaldo.
-- Rapaz! Valdete, fez um escândalo, armou o maior barraco, e não parava de gritar, viado gay, viado gay. O ódio dela era tanto, que ela sangrou os lábios de tanta morde-los! Chorava, babava e sangrava, meu Deus do céu! Que horror!
-- Eaí! Maluco, o que você fez? Perguntou Olavo.
-- Jesus amado! Ela separou de mim na hora, dizia bem alto, viado gay não entra na minha casa. Marinalva a acompanhou até a nossa ex-casa e passou a noite lá com ela.
-- Caralho! E você! O que fez?
Arnaldo olhou para o chão, alisou as duas coxas ao mesmo tempo e falou sincronizado com as mãos subindo aos céus.
-- Dormi com o Gustavinho na casa dele. Acordei Arnaldinho bem!