in-Justiça
1ª Parte
Tubal Vilela três horas da tarde. Caleb está sentado num banco da praça, observando coisas que não fazem parte mais daquele ambiente. O chafariz, que na época, ele chamava de fonte luminosa. Sempre ia à praça com um irmão mais velho, Alephy ou com a irmã, Llayda, mas chegando lá, podia correr à vontade. Tinha algodão-doce e pipoca.
A cabeça de Juscelino Kubitschek às vezes assustava-o, era uma cabeça de concreto enorme, que ficava dentro do lago que tinha as águas coloridas, uma fonte tão bonita com uma cabeça enorme contrastando com as cores e a alegria de tantas crianças. Até hoje Caleb fica elucubrando, quem foi o gênio que meteu uma cabeçorra numa fonte de sonhos de inocentes?
Caleb lembrou também de um senhor, muito simples, humilde, sempre de chinelo de dedo, calça larga de brim, bolsos encardidos. Vendia laranja, mexirica e quebra-queixo. Um noite Caleb queria uma mexirica, de tanto insistir com Alephy, conseguiu. Entrementes no caminho para o vendeiro, o irmão mais velho lhe desferiu um coque, esse recocheteou e atingiu o pé da orelha.
Alephy foi até o vendedor, pediu uma mexirica e antecipou o pagamento. O fruteiro ofereceu para descascar a fruta, todavia antes de Caleb decidir, o vendedor deliberadamente começou a desnudar a fruta, quando terminou entregou-a para Caleb. O irmão partiu dando as costas ao vendeiro e para Caleb. Alguns passos rápidos e Caleb alcançou Alephy rindo. Esse lhe falou
-- E aí Caleb! Vai encarar a unha tetânica!
-- Caleb tinha visto a unha enorme, toda preta no polegar direito do vendeiro, foi esse dedão que começou a cavucar e retirar todas as cascas da fruta, unha preta, misturada de terra, pústula e sangue velho. Caleb olhava a mexirica e em cada gomo via uma unha tetânica!
Não chupou a fruta nem jogou-a fora, Caleb analisou cada pedacinho da unha do vendeiro que multiplicara na mexirica, doze gomos, doze unhas. Ofereceu essa a um colega que só encontrava-o na praça. Então Alephy pensou: -- O que não mata fortalesse!
Há aqueles que exprimem, enquanto há aqueles que registram nos anais dos folhetins, sobre as injustiças no Brasil atinente às decisões judiciais. As pessoas que têm poder econômico nunca são presas, sempre são açambarcados, ou conseguem postergar a decisão por meio de manobras (manobras estas dentro da legalidade penal).E sempre com tantos recursos (recursos na primeira instância, na segunda, na terceira, na quarta e nas quintas também – uma quinta é aqui neste plano, a outro é em outro plano!) que, quando sai a decisão final, o acusado é beneficiado. Portanto, os ricos, não são presos, mas os pobres são, isto realmente é injusto?
Acredito que não é injusto um rico não ser preso. Por quê? Para responder a esta questão é preciso fazer uma análise à distância dos sentimentos primários, analisaremos primeiro a estrutura do sistema, depois as sentenças:
1º-O Brasil de hoje não tem penitenciárias suficiente para atender nem a metade dos mandatos de prisões. Para resolver esse problema seria preciso construir muitas penitenciárias, seria necessário um grande investimento em reforma nos presídios atuais que são verdadeiras gaiolas para canarinho. Contratações de profissionais das áreas jurídica, administrativa e de manutenção das penitenciárias, também se faz necessário
2º-O judiciário dos Estados e municípios deveriam ser modernizados, aumentar o número de funcionários, do agente da polícia civil até os juízes, isto em todos os Estados da federação.
3º-O judiciário federal teria que ser também modernizado e haver mais contratações de pessoas, do agente até os juízes federais.
Este investimento teria outro grande problema, resolver o desafio da corrupção nos três poderes, fato esse que é endêmico. Seria algo inimaginável, pois para tal ação seria necessário que, juízes federais sentenciassem seus pares, assim como, deputados denunciassem seus correligionários. Isto em todas as esferas do judiciário, legislativo e executivo. Se tal evento ocorresse poderíamos afirmar, e até os ateus diria, isto é uma intervenção divina! Ou seja, um milagre!
Você leitor amigo, já imaginou um ministro, ou um deputado federal, ou um juiz federal sair do seu local de trabalho e ir direto para cadeia? Não! Nós não imaginamos isso no Brasil, porque sabemos muito bem que isso só acontece na cabeça de candidato, pois esse ao se tornar eleito esquece tudo.
Todavia porque não é injusto libertar o rico, mas manter preso o pobre? Analisaremos o caso do rico primeiro:
O cidadão que é rico, tem muito para gastar e investir em vários setores, inclusive no judiciário. Esse gera dinheiro, inclusive para os pobres. O rico pode contratar bons advogados, bons assistentes, gasta com investimentos em palestras, cursos, viagens para uma centena de lugares.
Não estou aqui afirmando que o rico deve investir em desembargadores, juízes, delegados, agentes da polícia civil, burocratas da esfera do judiciário, alguns da esfera do legislativo… Por favor leitor, não me compreenda tão depressa, o que não falta aos ricos são meios para se evadir e encontrar novos caminhos para uma sentença feliz para ele e avistar um belo horizonte.
Pela perspectiva que aqui apresento, crio um rico fictício para melhor explanar um fato: Apate1 é um próspero empresário, que investe em vários setores da economia do país. Pois bem, uma bela noite, ele, bêbado e dopado com tudo que deus-lhe-deu-direito, atropela três pobres elementos que vivem com menos de um salário mínimo, esconde do sol e da chuva num barraco, não tem água encanada, a energia é um gato e a televisão funciona com um GatoNet. No bairro deles não há rede de esgoto, ou seja, é um indivíduo que sonha que um dia vai se tornar uma pessoa, talvez até um cidadão!
Apate1, nosso empresário, pode gastar muito dinheiro com o sistema judiciário e continuar a fazer grandes investimentos pelo país, enquanto que um pobre não investe nada e vive pedindo cesta básica, bolsa família, vale-gás, escola com merenda para o filho alimentar. Ou seja, o pobre pede, o rico gasta.
A questão da sentença:
Por que vamos manter um rico na cadeia se não há lugar para todos que deveriam estar presos? O Sistema é montado para isto mesmo, o Brasil não tem lugar para todos os acusados irem para a cadeia. O juiz tem que decidir quem deve ficar lá ou não, pois não há lugares para todos. Aqui entra a matemática financeira, MAIS VALE suprimir um que investe e tem para gastar com muitos, do que liberar um que não tem nada para gastar com ninguém.
Imagine! Dez pessoas são condenadas à prisão, só há lugar para três pessoas, quem você enviaria para LÁ! Aquele que só pede ou aquele que pode lhe dar um emprego!
Justiça, o que significa este termo propriamente:
“A ordem das relações humanas ou a conduta de quem se ajusta a essa ordem2”.
E quanto ao termo “Direito”
“Existem quatro: direito Positivo; direito Natural; direito à força; direito como uma Técnica social3”.
Caro leitor amigo, pegue o primeiro termo (justiça), junte o ao segundo termo (direito), e você perceberá em pouquíssimo tempo por que o direito é uma Ciência. Somente os mais ilustríssimos cientistas são capazes de explicar porque é assim e porque não é assim.
Uma coisa e outra coisa são diferentes na mesma proporção, que são as mesmas coisas partindo dos“Doutores (Quot capita, tot sententiae4) da lei!
Por exemplo:
Um sujeito penetra num escritório de advocacia e diz ao “Advogado: (o advogado é um ser em atividade amoral, ‘condição Sine qua non5’)”:
– Matei uma pessoa!
O “Advogado” diz:
– Estão dizendo que você matou; é diferente! Quem é o senhor?
– Eu me chamo Tersistes6.
– É, realmente você matou, assim como mereceu aquela bela cajadada no lombo que traz a marca até os dias de hoje.
“Em geral. A lei é uma regra dotada de necessidade, entendendo-se por necessidade. Impossibilidade de que a coisa aconteça de outra forma. Uma força que garanta a realização da regra7”.
Se, se enquanto se, o homem pensasse menos na sua sobrevivência e analisasse o meio, o sistema e a estrutura do sistema que faz parte, com certeza, entenderia a partir da citação acima, porque há homens livres e outros não, ricos e pobres. E até! Se você acredita em Deus, necessariamente acredita em diabo!
----------------------------------
1Na mitologia grega, Apate era um espírito que personificava o engano, o dolo e a fraude.
2 - Dicionário de Filosofia Nicola Abbagnano.
4 - Cada cabeça uma sentença
5 - em a/o qual não pode deixar de ser
6 - Personagem da Ilíada de Homero. Um soldado raso que palpitou num conselho de reis, semi-deuses e generais.
7 - Dicionário de Filosofia Nicola Abbagnano.